
O Conselho Federal de Corretores de Imóveis (Cofeci), em parceria com os Conselhos Regionais (Creci), publicou em 2025 uma norma inédita que regulamenta a tokenização imobiliária no Brasil. Trata-se de um marco regulatório para o mercado de imóveis, que até então operava em ambiente predominantemente analógico e sujeito a longos processos burocráticos. Com mais de 1.500 palavras, este artigo explica em detalhes o que muda, como funciona a tokenização de imóveis, quais as principais diretrizes da norma e o impacto para corretores, investidores e todo o mercado imobiliário.
- IBGE Abrirá 9.580 Vagas Temporárias para Agentes de Pesquisa e Supervisores em Todo o Brasil
- Forbes The Founders 2025: Os Empreendedores que Fazem a Diferença
1. O que é Tokenização Imobiliária?
Tokenização imobiliária é o processo de transformar direitos sobre um imóvel — seja a propriedade total, frações ideais ou receitas de aluguel — em ativos digitais denominados tokens, registrados em uma blockchain (cadeia de blocos). Cada token corresponde a uma fração do imóvel e pode ser adquirido, transferido ou negociado de forma descentralizada, automática e transparente.
Esse modelo permite:
- Fracionar o valor de um imóvel em centenas ou milhares de partes iguais
- Facilitar a entrada de pequenos investidores no mercado imobiliário
- Aumentar a liquidez de ativos tradicionalmente ilíquidos
- Automatizar contratos por meio de smart contracts (contratos inteligentes)
A norma do Cofeci vem justamente dar respaldo jurídico e operacional a esse universo, garantindo segurança para corretores, incorporadores, investidores e operadores de plataforma.
2. Por que Regulamentar a Tokenização Imobiliária?
Desde o início dos experimentos com blockchain no Brasil, empresas e startups vêm propondo projetos de tokenização de fundos imobiliários (real estate investment trusts, ou REITs) e de imóveis físicos. No entanto, a ausência de uma norma específica trazia riscos:
- Insegurança jurídica: falta de clareza sobre a natureza dos tokens (segurança ou ativo digital)
- Riscos de fraude: ausência de processos de due diligence padronizados
- Conflitos de competência: dúvida sobre sobre quais órgãos reguladores (CVM, Cofeci, Banco Central) atuar
- Desproteção do consumidor: investidores sem garantias sobre validade jurídica do contrato de tokenização
Ao publicar a norma, o Cofeci redefine atribuições dos corretores de imóveis, introduz padrões de diligência (know your customer, know your asset) e alinha o setor ao marco legal existente — especialmente à Lei nº 14.478/2022, que trata de alienação fiduciária e garantias imobiliárias.

3. Quem Deve Cumprir a Norma?
A norma do Cofeci atinge diretamente:
- Corretores de Imóveis: obrigados a obter certificação específica em tokenização e registrar operações no Creci
- Loteadoras, Incorporadoras e Construtoras: instituições que desejam emitir tokens precisam seguir o padrão de governança e compliance
- Plataformas de Tokenização: empresas de tecnologia que hospedam smart contracts devem se registrar no Conselho e comprovar auditoria de segurança
- Investidores: cadastramento, verificação de identidade e comprovação de capacidade financeira serão exigidos para acesso às ofertas
O objetivo é criar um ecossistema coeso, em que cada ator conheça seus direitos e obrigações.
4. Principais Pontos da Norma
A norma publicada pelo Cofeci detalha procedimentos e obrigações em dez capítulos. A seguir, listamos os pontos mais relevantes:
- Definição de token imobiliário e classificação do ativo
- Registro prévio de projeto de tokenização junto ao Creci
- Exigência de contrato escrito entre proprietário, emissor de tokens e investidor
- Padrões mínimos de due diligence para comprovar existência de matrícula e ônus do imóvel
- Criação de carteira digital por meio de entidade credenciada
- Smart contracts auditados que incluam cláusulas de reversão em caso de inadimplência
- Divulgação de prospecto detalhado, com informações sobre riscos, taxa de administração e política de liquidez
- Mecanismos de votação descentralizada para decisões de assembleia de coproprietários tokenizados
- Regras sobre distribuição de receitas de aluguel e venda de imóvel
- Fiscalização e penalidades por descumprimento, que variam de advertência até cancelamento de registro profissional
Essas regras reforçam transparência, governança e segurança jurídica para todas as partes envolvidas.
5. Etapas para Tokenizar um Imóvel
O processo, conforme a norma, deve seguir cinco fases:
- Planejamento e Estudo de Viabilidade
• Avaliação patrimonial do imóvel;
• Análise de mercado;
• Determinação de frações a serem tokenizadas. - Registro e Due Diligence
• Verificação de matrícula e certidões negativas;
• Levantamento de pendências fiscais ou judiciais;
• Encaixe em regulamentação de incorporação imobiliária. - Emissão de Tokens
• Desenvolvimento de smart contract em blockchain autorizada (Ethereum, Polygon, Solana);
• Criação de token padrão (ERC-20, SPL etc.);
• Registro do prospecto e do contrato de emissão no Creci. - Oferta e Distribuição
• Publicação do prospecto;
• Captação de recursos junto a investidores aprovados;
• Liquidação em blockchain e entrega de tokens. - Gestão e Governança
• Pagamento de receitas (aluguéis, dividendos) diretamente nas carteiras dos investidores;
• Votações digitais para decisões sobre manutenção ou venda;
• Prestação de contas periódica ao Creci.
Seguir cada etapa assegura conformidade com a norma e fortalece a confiança do mercado.
6. Impacto para Corretores de Imóveis
Para os cerca de 400 mil corretores registrados no Brasil, a tokenização representa uma transformação na atuação profissional:
- Nova certificação: será obrigatório curso de atualização e exame para operar em tokenização
- Comissão de vendas: percentuais poderão ser negociados tanto na captação de investidores quanto na gestão posterior
- Atuação consultiva: o corretor precisará ter conhecimentos de blockchain, compliance e tributação de ativos digitais
- Integração com cartórios e registradores: colaboração para garantir a validade dos registros em blockchain e nos livros de registro imobiliário
Em resumo, surge uma nova especialidade dentro da profissão, agregando valor ao serviço tradicional.
7. Vantagens da Tokenização para Investidores
Investidores de todos os perfis ganham com a nova modalidade:
- Acesso a imóveis de alto padrão — antes restritos a grandes fundos — em frações de baixo valor
- Liquidez acelerada — possibilidade de vender tokens em mercados secundários 24 horas por dia
- Diversificação geográfica — investir em imóveis em diferentes regiões sem sair de casa
- Transparência e auditabilidade — todas as transações ficam registradas em blockchain pública
- Custos reduzidos — eliminação de intermediários tradicionais e redução de taxas cartoriais
Esses benefícios tornam o mercado imobiliário acessível a uma base maior de investidores.
8. Desafios e Riscos a Serem Gerenciados
Apesar do potencial, a tokenização imobiliária ainda enfrenta desafios:
- Regulação de valores mobiliários: tokens podem ser considerados valores mobiliários pela CVM, exigindo dupla autorização
- Tributação incerta: definição de tratamento fiscal para ganho de capital e distribuição de rendimentos
- Cibersegurança: necessidade de auditoria constante para prevenir hacks em smart contracts
- Educação do investidor: risco de apostas especulativas sem compreensão plena do ativo
- Integração com registros públicos: adaptação de cartórios à interoperabilidade com blockchains
O sucesso depende de uma curva de aprendizado e de aperfeiçoamento contínuo das normas e das plataformas.
9. Comparativo: Tokenização x Mercado Tradicional
Aspecto | Mercado Tradicional | Mercado Tokenizado |
---|---|---|
Entrada mínima | Alto (geralmente acima de R$ 100 000) | Baixo (fracionamento em R$ 500 ou menos) |
Liquidez | Baixa (venda via corretores, semanas) | Alta (negociação em marketplace, 24/7) |
Custo de transação | Cartório, ITBI, honorários | Taxa de rede blockchain, custódia digital |
Transparência | Parcial (consulta em cartório) | Total (registros públicos na blockchain) |
Tempo de fechamento | Meses | Dias ou até horas |
Governança | Assembleia presencial | Votação eletrônica via smart contract |
Esse comparativo evidencia ganhos de eficiência, mas ressalta a necessidade de ajustes legais e operacionais.
10. Exemplos Práticos de Projetos-Piloto
Nos últimos anos, algumas iniciativas já testaram tokenização de imóveis no Brasil:
- SP Ledger: colaboração com incorporadora para tokenizar salas comerciais em São Paulo
- HodlProperties: plataforma que vende cotas de edifícios residenciais em Curitiba
- TokenHouse: projeto de tokenização de loteamentos em Pernambuco
Cada piloto contou com apoio de advogados especializados, auditores de smart contract e consultoria do Creci, preparando terreno para adoção em larga escala após a norma.
11. Interação com Órgãos Reguladores
A norma do Cofeci não elimina a necessidade de diálogo com outros órgãos:
- CVM (Comissão de Valores Mobiliários): avalia se tokens configuram valores mobiliários
- Banco Central: regula prestadores de serviço de ativos virtuais (PSAV) e custódia
- Receita Federal: define diretrizes tributárias para operações em blockchain
- Judiciário: estabelece precedentes em disputas sobre contratos tokenizados
Um ambiente regulatório harmonizado é fundamental para a consolidação da tokenização.
12. Perspectivas Futuras do Mercado Imobiliário Digital
Nos próximos anos, espera-se que:
- Plataformas tokenizem cada vez mais empreendimentos, de residências unifamiliares a shopping centers
- Cartórios adotem sistemas de notarial em blockchain, reduzindo custos e tempo de registro
- Investidores institucionais alociem parte de portfólio em tokens imobiliários, diversificando ativos alternativos
- Integração com finanças descentralizadas (DeFi), permitindo empréstimos garantidos por tokens
A tendência é que o mercado imobiliário se torne cada vez mais digital, eficiente e aberto a novos públicos.
13. Como Corretores Devem se Preparar
Para aproveitar a revolução, corretores devem:
- Fazer curso de tokenização reconhecido pelo Cofeci
- Estudar fundamentos de blockchain e smart contracts
- Atualizar conhecimentos em compliance, AML/KYC e due diligence digital
- Firmar parcerias com plataformas tecnológicas e escritórios de advocacia especializados
- Divulgar tokenizações como diferencial de mercado
Profissionais que se anteciparem estarão à frente na nova geração de serviços imobiliários.
14. Conclusão
A norma do Conselho Federal de Corretores de Imóveis para tokenização imobiliária representa um divisor de águas no mercado de propriedades brasileiro. Ao estabelecer regras claras, processos de due diligence e mecanismos de governança, o Cofeci e os Creci oferecem segurança jurídica e operacional para corretores, incorporadores e investidores. A tokenização promete democratizar o acesso a imóveis, acelerar negócios e reduzir custos, mas exige adaptação de legisladores, registradores e profissionais.
O caminho para um mercado imobiliário digitalizado passa pela educação, pela colaboração entre órgãos reguladores e pelo aperfeiçoamento contínuo das plataformas tecnológicas. Corretores que abraçarem a tokenização estarão habilitados a liderar uma nova era no setor, na qual frações de imóveis poderão ser compradas e vendidas com a mesma facilidade de ações na bolsa de valores — um passo definitivo para tornar o Brasil protagonista na adoção de inovação em real estate.